Sócrates, a docência e o ET de Varginha

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Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna

O tempo está passando. Essa semana completei vinte e um anos de exercício da docência. Um pouco mais de duas décadas dedicadas à tarefa de ser professor. Fui lembrado por uma amiga da minha avó paterna, em uma rede social, do momento em que Dona Carminha anunciara aos mais próximos o meu ingresso nesta nobre carreira. Felicidade. Explosão de alegria. “Meu neto lecionando”.

Minha primeira paixão foram os livros, objetos que até hoje nutro profundo amor. Leituras que me fizeram sonhar, refletir, adquirir elementos responsáveis pelo gosto de escrever. Confesso que as teclas das Olivettis e o tabaco queimando nas redações dos jornais no início da década de 1980 alicerçaram esse amor; meu pai proporcionou esse encontro, direcionou-me ao esconderijo magistral com elementos essenciais à construção da escrita. Ele é o responsável por me apresentar às letras. Até tentei ser jornalista no ofício. E não foi pela fumaça de outrora.

Em meados da década de 1990, uma orientadora vocacional, vinda de Varginha-MG, estabeleceu-se no interior de São Paulo, precisamente Taquaritinga, indicando-me Artes Cênicas como futuro. Avisei-a que não seria ator. Ela foi veloz e precisa: “Sua profissão é dramaturgo”. Sim. Apontou-me a escrita de peças teatrais como labor. Continuei escrevendo, contribuindo com os periódicos citadinos, a dramaturgia ainda perpassa pelos meus pensamentos, assim como a lembrança do episódio do ET de Varginha.

Certa vez, retornando de uma peça teatral, apresentada na Escola Técnica Estadual “Dr. Adail Nunes da Silva”, um professor de Língua Portuguesa disse-me: “Vá ser professor de Língua Portuguesa!”. Pensei. Gostei da ideia. Busquei informações. A reflexão amadureceu ao observar que no meu entorno todos eram professores. Tios, primos, amigos etc., exercendo com primor a nobre profissão. Era essa a minha profissão. O meu amor.

Do primeiro dia de aula, meu contato com a sala de aula, o quadro negro e aquela imensidão a ser preenchida, os alunos me observando e testando-me, a sala dos professores e alguns dos meus ex-professores, ainda carrego o frio que perpassa pelo meu dorso e morre em meu ventre. Um alerta. Jamais adentre à sala de aula acreditando ser o dono do saber. Seja um parteiro das ideias, assim como foi Sócrates. Busque o diálogo. Exercite a argumentação dos seus discentes. Inspire-os ao debate. Promova a escrita. Crie cidadãos. É isso que faço. É dessa forma que conduzo minhas aulas. É através dos meus estudos, das minhas leituras que busco trazer à tona o escriba que existe em cada um dos meus alunos. Tornando-os ourives dos próprios textos, lapidadores de um tesouro escondido.

Nas letras da minha filha mais velha, Beatriz, hoje minha aluna nas aulas de Redação, vejo que ensinar não é uma tarefa fácil, todavia um momento de prazer. Talvez tenha dedicado mais tempo aos meus alunos, porém nos textos da minha filha querida, aprecio sinônimos, questionamentos, soluções, construídos com a mescla dos livros e das séries assistidas, arquitetando-se em busca do texto perdido, do brilhantismo escondido. Textos que um dia desejei construir, porém não fui capaz. Como bradara Sócrates: “Só sei que nada sei”.

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor da Rede Adventista em Santa Catarina; Corretor de Textos em “Redação sem Medo”.

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