Poseidon, o advento da tecnologia e o governo de Zeus

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Por: Prof. Sergio A. Sant’Anna

Era avesso aos adventos da tecnologia, lembro-me da minha Olivetti comprada nas Lojas Colombo, paga em doze prestações de uma URV. E aí não vai muito tempo, exatamente 1993. Até então escrevia os meus textos para o Diário Cidade de Taquaritinga numa também Olivetti do meu tio, professor Geraldo Sant’Anna, hoje escritor, membro de algumas Academias de Letras espalhadas por este extenso território nacional. Durante anos datilografei os meus textos e entreguei-os ao Hamilton Aiéllo, ao Newton Morselli e também ao meu pai, então editor do Jornal Tribuna de Taquaritinga, minha terra natal. Não posso deixar de relatar, os meus textos continuaram a ser entregues no Tribuna, datilografados, para o China e depois para o então editor do mesmo jornal Edson Cândido, já faz tempo.

O amigo Gustavo Girotto, também recebeu os meus textos datilografados, numa parceria dele com o Calil, filho do saudoso Dr. Fued Simão. Aquele periódico, elaborado por dois guris, cheio de ideias e mais alguns jovens como eu, que tinham sonhos (ainda os temos) pareciam incomodar alguns caciques e estava aí o sucesso do hebdomadário. Pena que durou pouco, pois pareciam os meninos não terem rabo preso com ninguém, daí o falecimento prematuro do semanário. Mas nem tudo vira ouro e sigamos com o nosso retrato do cotidiano. Depois de alguns anos e depois da leitura de uma crônica do imortal João Ubaldo Ribeiro, prolixo por demais, mas eu o adorava, o baiano retratava que tinha se rendido a escrita feita via computador,  parece que me caiu a ficha, ou melhor,  (neste tempo o orelhão à base de fichas já tinha dado adeus) decidi por seguir aos conselhos do velho escritor e começar a escrever via computador. Tratei logo de juntar algum dinheiro, com o suor das minhas primeiras aulas, dadas à livro didático, e comprar o meu PC. Confesso que o amigo Gustavo Girotto lançava-me o canto da sereia para me convencer a continuar escrevendo à mão antes de passar o texto definitivo para o computador, fui cantado, mas depois de algum tempo tudo se tornou mais fácil, o computador me dava praticidade e logo estava pronto, delineado, estruturado o meu filho. Saiu de mim e em pouco tempo ganhava vida, tratava de mandá-lo para o periódico. Quantas vezes, em função da minha briga com os veículos automotores, requisitei um mototaxista para levar minha obra até o veículo de comunicação. Inúmeras.

Olho para os meus alunos, meus colegas professores e todos portando os seus celulares. Um mais equipado que o outro. Tratei logo de adquiri-lo, não comprei um tijolão, neste período eu ganhava alguns trocos (hoje um pouco mais) e não dava para abusar deste modismo, não foi lá um Samsung, mas eu escutava o meu interlocutor, recebia chamadas para as aulas eventuais, mantive os primeiros contatos com minha esposa, ligações interestaduais. Fui longe. Na verdade, minhas chamadas. E sempre prezei por um telefone celular capaz de fazer ligações, sem estes recursos tecnológicos, capazes de levar o seu portador a mundos infinitos, assuntos vários, diversos interlocutores. O que seria de Jakobson e Bakhtin hoje em dia, uma nova teoria, novas funções da linguagem e mais pessoas no discurso?!

   Em 2014 uma das minhas coordenadoras, em um dos colégios que lecionava, em Porto Alegre, perguntara-me se não tinha whatsapp, afirmei que não. Ela insistiu: “… mas deveria!”. Conversando com alguns colegas nas salas de professores eles me fizeram a mesma indagação da professora coordenadora… Mas confesso que não fui capaz de resistir por tanto tempo. Comprei um celular apenas com a intenção de me comunicar, instalei alguns recursos necessários e fui logo usando. Com o passar dos anos foram tantas às invenções, que perdemos de vista. Hoje em meio às aulas remotas conferimos que o acesso à tecnologia é restrito. Inúmeros são os brasileiros que não possuem o acesso às essas tecnologias; há que o Governo traçar estratégias e possibilidades para que todos os membros da sociedade nacional possam, também, acessar aos sites, dialogar com outros, realizar os exercícios propostos pela escola. O acesso à tecnologia é um direito.

Definitivamente não serei eu a carregar o bastião da aversão a este mais novo invento tecnológico, pois a tela do computador vem me hipnotizando com as atividades dos meus alunos que me mandam redações para serem corrigidas aos jorros. Um bom sinal. O Ensino à Distância será ferramenta indispensável nesse novo ciclo que se avizinha. Não será o protagonista, todavia ganhará o assento de coadjuvante, emergindo como Poseidon. Zeus ainda governa.

*Prof. Sergio A. Sant’Anna – Professor da Rede Adventista em Santa Catarina; Corretor de Textos em “Redação sem Medo”.

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