Artigo: Cultivando a Paz nas Escolas

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Por: Fabíola Michele Paulino Mestriner

Venho trabalhado há alguns anos como gestora de conflitos em escritório de advocacia que atende conflitos de família, relacionado principalmente com partilha de bens em casos de divórcio, dissolução de união estável e inventários.

Não fosse apenas o conflito no campo patrimonial, na maioria dos casos o litígio também vem acompanhado da disputa judicial de guarda de crianças ou adolescentes, regime de convivência dos filhos com os genitores e pensão alimentícia tanto para os menores quanto para um dos cônjuges (ou companheiros).

Nesses embates, vejo que os principais afetados em casos de separação dos pais, de fato, são os filhos.

Outro dia, em visita a uma escola para palestrar sobre conflitos familiares, fui chamada pelo professor que me disse que uma criança, a mais participativa, a mais alegre e a mais falante da sala, vinha apresentando um quadro diferente de comportamento ao qual todos estavam acostumados. A criança estava mais calada, distanciou-se dos amigos e não queria mais participar das atividades propostas pelo professor. O rendimento escolar ainda estava o mesmo, a criança tirava notas boas, porém o brilho nos olhos dela já não era como antes.

Foi então que procurei entender o que vinha acontecendo com esta criança: o pai estava saindo de casa e ela estava com medo.

É difícil para quem trabalha com isso não se sensibilizar com casos que envolvem crianças e muitas vezes percebemos que eles não estão se sentindo bem com o que está ocorrendo com os pais, por medo de perda de um deles, de se sentirem sozinhos ou então de pensarem que deixarão de ser amados por um ou por outro genitor.

A gente percebe que as crianças passam a ter comportamentos diferentes nas escolas, com os amigos e até mesmo com os familiares. Muitas vezes são consideradas somente “birras de crianças” e não é dada a devida atenção para elas.

Nem só devido a divórcio ou luto que a criança não é ouvida, afinal eles são apenas crianças e não precisam participar ou opinar em assuntos que supostamente dizem respeito apenas aos adultos.

Por estes motivos, passei a dedicar parte da minha rotina de trabalho para enfrentar o problema no local que mais evidencia a dificuldade das crianças, que é a escola.

Na escola trabalho como Mediadora Escolar.

De fato, a mediação não deve ser vista apenas como ferramenta de resolução de conflito no ambiente escolar, porém ela tem por objetivo desenvolver o conceito de Cultura de Paz entre os membros da instituição de ensino, seja o corpo discente, o corpo docente, funcionários e comunidade que pertence a esse grupo escolar (pais, mães, tios, tias, avós, avôs, cuidadoras, babás, entre outros que diretamente participam da criação da criança)

A melhora da consciência individual e social, a comunicação, a empatia, a solidariedade, a convivência e a melhor compreensão das adversidades da vida escolar são apenas alguns fatores que são desenvolvidos pela mediação escolar.

Muitas vezes negligenciamos situações que podem ser resolvidas com diálogo, porém ao deixarmos os conflitos crescerem eles podem se tornarem incontroláveis e em alguns casos situações embaraçosas e mesmo perigosas podem surgir.

Incentivar a prevenção de conflitos e caso estes ocorram, resolvê-los com o diálogo, torna-se a melhor justificativa para implantação da Mediação Escolar.

Muitos de nós ainda temos a cultura de que o melhor é revidar a um ataque de um amigo e esquecemos que muitas vezes somos nós mesmos que provocamos esse ataque.

Às vezes uma criança leva um tapa ou uma mordida de um amiguinho que queria justamente o brinquedo que a “vítima” estava brincando e que em nenhum momento compartilhou a brincadeira com o “agressor”. Será realmente que os papéis são esses ou poderiam serem invertidos?

Por esse motivo a educação da Cultura da Paz deve iniciar desde muito pequenos. Alguns estudiosos defendem a implantação da cultura de paz com crianças de 3 anos através do Círculo do Diálogo.

O Círculo do Diálogo é uma ferramenta poderosa na reabilitação e na reconstrução da comunidade para a resolução do conflito. Ele permite que as pessoas expressem seus sentimentos, onde cada participante tem a oportunidade de falar, no seu devido momento, de forma encorajada e escuta atenta aos outros participantes.

O círculo acolhe a dor, a alegria, desespero, esperança, a raiva, o medo, as diferenças e o paradoxo. Cada pessoa que participa do círculo tem a oportunidade de expor sua verdade sem que seja imposto ao outro.

O círculo desenvolve a democracia enraizando o respeito de cada um. Desenvolve a prática de cidadania responsável e pode ser aplicado em vários locais: comunidade, escola, família, empresas, entre outros.

Na Mediação Escolar, o Círculo do diálogo tem forte impacto sobre a disciplina e aprendizado das crianças, podendo ser utilizado em crianças a partir dos 3 anos de idade.

Impactos:
– menos tempo para acomodar;

– maior aprendizado;

– mais atenção / menos distração;

– maior função do cérebro;

– segurança, cuidado;

– criança se sente parte de uma comunidade saudável.

Em 14 de maio de 2018 foi sancionada pelo Presidente da República a lei 13.663 que altera a lei de diretrizes e bases (9394/96) incluindo no artigo 12 os incisos IX e X.

Nesses incisos são tratados a incumbência dos estabelecimentos de ensino de promoverem medidas de conscientização, prevenção e combate ao bullying e de estabelecerem ações destinadas a promoção da Cultura da Paz.

A mediação escolar atua nessas duas medidas de prevenção e combate ao bullying assim como a promoção da Cultura da Paz de forma a transformar o indivíduo desde a sua base educacional em pessoa que tenha a capacidade de resolver seus próprios conflitos sem que seja necessário utilizar de violência física, mental ou intelectual.

Sejamos mais diálogo e menos conflito,

Sejamos mais amor e menos desafeto,

Sejamos Cultivadores de Paz.

 

*Fabíola Mestriner é gestora de conflitos da Mestriner Gestão de Conflitos. Mediadora Privada registrada no Cadastro Nacional de Mediadores Judiciais do CNJ e do Tribunal de Justiça de São Paulo. Certificada de acordo com a Resolução 125/2010 do CNJ pela Escola Superior de Advocacia. Também possui formação em Magistério e Administração de Empresas, pós graduada em Economia e Gestão Educacional. Trabalhou como professora universitária, gestora de vendas e consultora empresarial. Membro da Associação Brasileira de Direito Educacional (ABRADE).

 

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